quarta-feira, 9 de abril de 2014

JORNALISTA PORTUENSE MANUEL VITORINO LANÇA LIVRO SOBRE A GUINÉ-BISSAU

“Guiné-Bissau, Um País Adiado” é um livro do jornalista portuense Manuel Vitorino sobre um país onde “não se vive, sobrevive-se”. Com fotografias de Hugo Delgado, tem lançamento agendado para a próxima quinta-feira, pelas 18h30, no Palacete dos Viscondes de Balsemão, no Porto.

Image de Missão cumprida
O dia em que “a guerra acabou”, aquele em que os militares de Abril fizeram a Revolução dos Cravos, “foi o dia mais luminoso” da vida de Manuel Vitorino.
O portuense partiu para a Guiné-Bissau poucos meses antes do 25 de Abril de 1974, para engrossar o contingente de militares que já lá estava. Quarenta anos depois regressou, pela primeira vez desde a queda do regime salazarista, e porque a ideia de escrever este livro era antiga, e encontrou “um país completamente destroçado, destruído devido à incúria e ganância dos políticos e dos militares”.

“Sempre tive a ideia de escrever um livro sobre a Guiné. Durante anos acompanhei com regularidade a situação política e militar, os golpes e contragolpes, as lutas pelo Poder sempre resolvidas a tiro”, partilha o jornalista, que confessa ter uma ligação “afectiva” ao “povo das tabancas que, vivendo na mais completa pobreza, sempre procurou ser digno”.

Vitorino partiu para a guerra colonial “com 21 anos, no dia 29 de Dezembro de 1973, entre o Natal e o Ano Novo”. “O país vivia em ditadura e tudo era proibido. Até a simples leitura do jornal ‘República’ deu direito a interrogatório na PIDE/DGS”, recorda.

Do dia que mudaria a sua via, a memória é nítida. “Estação de Campanhã cheia de militares, comboios apinhados de soldados, despedidas emocionantes, mais ainda na gare marítima de Alcântara, em Lisboa, pais, mães, irmãos, namoradas e esposas, milhares de lenços acenar quando zarpou o Niassa para o alto-mar. E muitas lágrimas no cais”.

“Sei uma coisa: a guerra colonial durou 13 anos, ceifou milhares de jovens nas 3 frentes de combate e deixou marcas traumáticas para a toda a vida em muitos jovens da minha geração. Ainda hoje, 40 anos depois, existem cicatrizes e uma enorme dívida de gratidão do país por todos aqueles que deram o corpo às balas pensando que estavam a lutar pela tal Pátria ‘una e indivisível’”, observa.

“Na Guiné não se vive, sobrevive-se”

Sobre o presente, Manuel Vitorino relata como o país “se transformou hoje numa placa giratória do tráfico de droga internacional”.

“Nunca vi tantos militares, generais e almirantes por metro quadrado como na Guiné, cerca de 1,6 milhões de habitantes. E tanta gente a morrer de fome, outros pela falta de um vacina, um simples medicamento”, lamenta.

O “enorme choque” começou quando aterrou no aeroporto local. “Não existem palavras para traduzir a angústia e o sobressalto. Só a perícia e a experiência dos pilotos da TAP conseguiram tranquilizar-me ao efectuar as manobras de aterragem do aparelho com segurança e eficácia. As ruas não têm iluminação pública, as estradas mais parecem ‘crateras lunares’ e o abastecimento de água é inexistente”.

Manuel Vitorino esteve quase um mês na Guiné-Bissau, onde contou com o apoio da ONG Mundo a Sorrir, “uma organização de médicos dentistas com 8 anos de trabalho efectivo no território e milhares de intervenções e tratamentos na área da medicina, higiene e saúde oral”.

“Na partida não tinha ideias pré-concebidas, mas nunca imaginei que o país estivesse tão destruído. Quase toda a herança colonial foi delapidada. Bissau é uma cidade caótica, suja e imunda, sem um metro de alcatrão, prédios degradados a par de edifícios enormes pagos pelos países cooperantes, geralmente com interesses locais como a China, Japão, Rússia. Em Bafatá o cenário é igual. Foi uma cidade linda, jardins e edifícios típicos da arquitectura colonial. Hoje está em ruínas. Até a pista da aviação foi danificada”, lamenta o jornalista.

O que mais o impressionou, contudo, foi “de sofrimento e resistência” de uma população que vive “na mais completa miséria – um dólar é o rendimento per capita” – e que “aprendeu a viver com pouco”. “Só os políticos e os militares de alta patente vivem dos negócios de milhões. A corrupção no aparelho de Estado generalizou-se e toda a gente vive de esquemas. A Guiné-Bissau é independente do ponto de vista formal, mas ontem como hoje continua dependente dos países doadores e da comunidade internacional”.

Das eleições agendadas para 13 de Abril, Manuel Vitorino espera pouco. “O país continuará adiado e ganhe quem ganhar os militares continuarão a ditar os destinos deste pobre país de África ocidental”.

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